Rúbricas 5

63 Na primeira, o controle tem origem externa ao passo que na segunda o controle é produzido pelo próprio trabalhador. A diferença entre o homem funcional nesses dois momentos está apenas no eixo do controle. Não houve alteração na necessidade do controle, mas apenas na forma como este foi viabilizado. Dentro da estrutura hierárquica, a gestão de pessoas e do desempenho era centralizada e desse centro emanava o controle, ao passo que dentro da estrutura em redes de projetos na forma de equipes autodirigidas, parte significativa da gestão de pessoas é conduzida de forma descentralizada pelos próprios membros das diversas equipes. Em ambos as condições, o processo regulatório do desempenho dos trabalhadores ocorre fundamentado e justificado nos conhecimentos sobre os determinantes do desempenho, tais como liderança, agenciamento, cultura organizacional, gestão por competências, entre outros. Todos esses conceitos integram o repertório de objetos da pot. Dessa forma a pot, ao longo da era industrial foi uma peça chave na produção de conceitos e de instrumentos que contribuíram significativamente para o sucesso do sistema econômico das organizações com fins lucrativos. A pot soube perceber as demandas da racionalidade do trabalho e responder a elas desenvolvendo instrumentalidade, como se pode constatar no momento da globalização dos negócios. Esse outro momento será desenvolvido na próxima seção. A construção da pot para a construção do homem modular A sociedade industrializada viu a alvorada do século xxi num vigoroso processo de virtualização do mundo e visível empoderamento dos indivíduos Estas duas condições alteraram de forma profunda o modo de agir das pessoas e, por corolário, as competências exigidas, os padrões de relacionamento e a instrumentalidade de ação. Em pequena síntese desse novo momento, pode-se dizer que a atual gramática do mundo do trabalho é movida por três grandes famílias de variáveis. A tecnologia digital, a fragmentação da economia e da produção e o capitalismo metafísico, dinamizando a produção do desempenho requerido pelo trabalho. A tecnologia digital consiste em um recurso extraordinário que facilita a interação entre os eventos, em velocidade acima das capacidades humanas. Desde a implementação dessa tecnologia e de seus desdobramentos na criação das redes eletrônicas e na telefonia celular, vive-se a ditadura do tempo real, contingência que impacta nas condições de vida alterando as relações entre a vida pessoal e a vida no trabalho (ambas sujeitas à regra do imediatismo). A gestão do “tempo real” tornou-se uma demanda significativa da capacitação profissional. Submetidas a eventos nessa velocidade, as pessoas estão continuamente sujeitas a diversas situações de risco que se manifestam nas tarefas e estímulos que são viabilizados pelos diversos meios de comunicação, na ubiqüidade eletrônica e na conseqüente necessidade de adaptação que pesa sobre seus desempenhos. Multiplicam-se os eventos que atingem o indivíduo e demandam dele algum tipo de reação e adaptação. Hoje, é comum alguns trabalhadores receberem dezenas de mensagens num mesmo dia. As condições criadas pelo volume e velocidade de situações e problemas tornam os indivíduos mais autônomos porque eles podem atingir eventos sem a necessidade de intermediação, a não ser dos aparatos de comunicação. Tais condições estimulam o individualismo, a cultura da urgência e lhes dão poder, mesmo sobre eventos distantes sobre os quais eles podem atuar até mesmo de forma incógnita. Esta nova realidade desencadeou um processo generalizado de mudanças criando aquilo que Archer (2002) denomina de um mundo caracterizado pelo aparecimento de propriedades emergentes que colocam pessoas, grupos, estruturas e instituições sendo alteradas em algum de seus aspectos e, conseqüentemente, gerando a necessidade de continua adaptação tanto para indivíduos como para empresas e instituições. A dinâmica criada na sociedade não deixou ileso, qualquer um dos aspectos significativos de sua organização, como se constata nas alterações do poder, da função e dos significados de todas as instituições tradicionais como a família, a escola, a religião, as profissões, os sindicatos e o emprego. O impacto dessas mudanças sobre a institucionalização do emprego não foi menos radical e nem menos abrangente, obrigando a pot a estudar as novas contingências como a fragilização do vínculo de emprego (Arthur & Rousseau, 1996), a formação e gestão de equipes (Levi, 2011), as múltiplas identidades (Marchington et al., 2005) e a virtualização das interações entre as pessoas (Sotto, 1998). Dentro dessa nova gramática, visível na gestão por projetos na forma de empresas-rede, o emprego emerge como um vínculo frágil, de curto prazo, pouco substantivo, emaranhado em diversos relacionamentos virtualizados. Nesse contexto, os indivíduos são continuamente desafiados a se adaptar a novas contingências do ambiente, sujeitos a controles mais abrangentes e complexos sobre suas vidas e cuidadosos em suas respostas não somente às necessidades da situação, mas igualmente, ao discurso (Dujarier, 2012). Essa nova forma de emprego impõe mais desafios para os indivíduos, uma vez que estes devem administrar parte significativa da adaptação das tarefas e de sua própria adaptação. Traduzindo tais mudanças para a esfera do desempenho, constata-se que este ocorre a partir de alta mobilidade dos indivíduos dentro de distintos ambientes, no exercício de atividades transversais (atuação fora dos limites institucionais da empresa ou do papel) e na significativa dependência da própria ação como mediadora dos determinantes estruturais. Se a ação e a estrutura disputam poder, espera-se dos indivíduos agilidade para avaliar a situação que enfrentam, adesão à adaptação requerida e competência para contribuir significativamente para a obtenção do resultado previsto. Assim concebido, o indivíduo é idealizado como um ser onipotente e polivalente,

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