Rúbricas 5

65 capaz de se transformar de imediato em outro, como num simples passe de mágica, ou sob ampla labilidade. Nessa idealização, o indivíduo se assemelha aos personagens desse brinquedo chamado de “lego”, no qual os “bonecos” são passiveis de mudanças rápidas em suas diversas partes. A aplicação do modelo do brinquedo “lego” ao contexto de trabalho deu origem a um novo conceito para a compreensão do trabalhador que foi convencionado de o “homem modular” (Kallinikos, 2003). Na era do “homem modular”, como bem descreve Kallinikos (2003), o indivíduo é “concebido como se fosse constituído por um número relativamente independente de conjuntos de comportamento que podem ser demandados isoladamente, ou em combinação entre si, para responder às variadas demandas da profunda diferenciação e dinâmica do mundo atual. Esse tipo de ser humano (é) um amálgama de distintas categorias de habilidades e comportamentos, uma colagem, como se fosse de diferentes peças e materiais que podem ser expandidos ou apagados, refeitos, reestruturados... capaz de ser decomposto em pedaços... deixando-se para trás quem não se encaixa na situação que demanda seu monitoramento...” (Kallinikos, 2003:15). Concebe-se o individuo fragmentado para se poder responder à demanda de alta flexibilidade para rápida adaptação a propriedades emergentes nas pessoas, estruturas e eventos, dessa forma, tal como nos bonecos do “lego” ele pode ser montado e remontado, para apresentar as competências exigidas pela situação. Atua-se sobre ele como se ele fosse constituído por módulos (tal como as crianças fazem com o personagem do “lego” que atende às funções atribuídas a ele naquele momento, através da fácil e imediata substituição de suas peças). Como conseqüência dessa visão, trabalha-se no curto prazo através da liderança e da gestão por competências que são dois instrumentos com potencialidade para substituir o que a criança faz com o lego na gestão de pessoas. Ambos constituem a base que a gestão do “homem modular” necessita. De um lado, a liderança participa como o processo que energiza o indivíduo e, por outro lado, a gestão por competências participa como o processo que garante a labilidade funcional que a volatilidade do ambiente pede do trabalhador. No destaque a essa dupla instrumentalidade surge a fórmula da administração do inicio do século xxi: controle sobre os resultados e auto regulagem na construção dos processos de produção. Embora outras questões continuassem merecendo certo destaque, como é o caso de cultura e motivação, nenhuma delas absorveu tanto os projetos de gestão como a liderança e as competências. Novamente, a pot desponta como fonte de recursos valiosos para esses dois campos, como se pode constatar, mesmo em exame rápido e superficial da literatura recente. A compreensão do desempenho dentro de um contexto assim volátil tem imposto diversos desafios aos pesquisadores e profissionais da pot, como se pode igualmente constatar na regularidade de centenas de trabalhos apresentados em congressos e conferencias, relatando pesquisas sobre o campo da organização do trabalho, do vínculo do emprego e do sofrimento no trabalho, com foco na eficácia do desempenho e no impacto da volatilidade do mundo sobre o trabalhador como sujeito. A concepção do “homem modular” enfatiza o paradoxo da fragilização dos indivíduos (demanda se sua fragmentação a serviço de necessidades da competitividade) e da demanda que eles sejam empreendedores de sua própria construção como sujeitos. Tais demandas são conseqüências da globalização dos negócios, da competitividade econômica e da tecnologia digital e revelam a necessidade de se reestudar a relação entre a pessoa e o ambiente. Nesse contexto, a pot assume nesse papel um objetivo, problemático e paradoxal que é a consideração da pessoa do trabalhador como sujeito e como recurso. De um lado, a pot é chamada pelas empresas para servir a sociedade estudando os processos regulatórios do desempenho, tendo em vista a eficácia dos empreendimentos. Por outro lado, a pot é igualmente chamada pela sociedade para servi-la estudando as possibilidades, caminhos e problemas da construção do trabalhador como sujeito, dentro de condições que até negam essa condição. Este chamado coloca a pot como instrumento a serviço dos processos emancipatórios. Hoje, com o rápido crescimento demográfico da população mundial, em proporções gigantescas, sem racionalização da produção não seria possível a oferta de alimento para todos. Por causa dessa demanda, a racionalização do trabalho por força da necessidade de eficácia na produção tornou-se uma questão estratégica da sociedade. Hoje, pode-se dizer que a pot vem sendo cobrada a dar contados processos regulatórios e dos emancipatórios, condição que a coloca diante de tarefas paradoxais porque, dentro da gramática da sociedade atual, esses dois processos são interdependentes. Esta dupla tarefa mostra os desafios da pot. Contribuições da pot para a construção do trabalhador como sujeito Respondendo a essas demandas que lhe vem sendo impostas pela sociedade sobre o seu papel na relação entre o homem e o trabalho, a pot aprofundou sua visão sobre o trabalhador ampliando seu olhar sobre a complexidade da adaptação ao trabalho e sobre os impactos de curto e de longo prazo sobre a pessoa. Esse olhar ampliado ganhou visibilidade, já nos compêndios e periódicos dos anos 1960, com pautas enriquecidas por temas como a saúde, qualidade de vida do trabalhador, realização pessoal e profissional, os desdobramentos dos direitos humanos e a felicidade. Trabalhos como a pesquisa de Menzies com trabalhadoras de enfermagem (1978), a investigação da relação entre institucionalização do trabalho e os sentimentos realizada por Pagés, de Gaulejac e Descendre (1987), o sofrimento no trabalho estudado por Dejours (1987) e o viés da fragmentação da pessoa

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